O dia 21 de agosto de 1997 seria o dia
em que mudaria toda a minha vida. Trabalhava em uma empresa que fazia
troca de transformador de alta tensão. Logo após o almoço saímos para
fazer uma troca em uma chácara. Chegando ao local preparamos todas as
ferramentas para executar o serviço. Logo que subi a escada seria o
momento em que levaria um choque de 13.800volts, ficando pendurando ao
poste e preso ao cinto, o que evitou que caísse lá de cima. Graças à
equipe de resgate, que chegou logo ao local, eu fui retirado de cima.


Aí começaria toda uma longa história em
minha vida. Chegando ao hospital com os braços queimados e parte do pé
esquerdo machucado, fui parar direto na UTI, mas a preocupação não seria
essa no momento, mas sim com a parte interna do meu corpo. Meu rim não
estava funcionando e se ele não funcionasse eu estaria morto hoje. Fazia
três dias que estava urinando sangue, mas graças a Deus ele começou a
funcionar. Após passar isso, a nova preocupação seria em tentar
recuperar os meus braços que estavam queimados, devido ao choque.
Mas, infelizmente não teria, mas jeito e
a única possibilidade seria a amputação dos braços. Eu estava
inconsciente e não sabia o que estava acontecendo. A autorização para
fazer a amputação ficou para os meus pais. O que não deve ter sido muito
fácil para eles. Após fazerem a amputação houve uma infecção nos braços
e tive que voltar para a sala de cirurgia para amputar mais uma parte
deles.

O palestrante Flavio Peralta - Crédito: Arquivo pessoal
Depois começou a parte dos curativos.
Quando a enfermeira chegava no quarto dava vontade de sair correndo. Com
os braços abertos para fazer a limpeza senti uma dor insuportável.
Então colocavam gazes na minha boca para poder gritar de dor e para que
as outras pessoas não se assustassem com os meus gritos. Passou a fase
de curativos. Agora seria o momento de fazer uma plástica no que restou.
O médico tirou a pele da minha perna para fazer o enxerto nos braços.
Para essa cirurgia foi necessário ficar no hospital uns 40 dias.
Após a recuperação viria o momento de
deixar os braços preparados para colocação das próteses. Mas, meu braço
esquerdo, o qual sobrou o cotovelo, teria que aumentar mais ou menos 6
cm, através da colocação de um aparelho, chamado Ilizarove. Nesta
cirurgia, coloca-se um aparelho com um monte de ferro dentro do osso.
Nesse momento as dores foram insuportáveis. Mas, deu tudo certo. Quando
fui tirar este aparelho tive um choque anafilático, causado pela
anestesia. E lá fui eu parar na UTI de novo. Ocorreu tudo bem e fui
embora no outro dia.
Agora teria que fazer um enxerto na pele
que estava fina se não suportaria a prótese. Vamos lá de novo para
cirurgia. O médico tentou tirar a pele da barriga, mas houve rejeição.
Tive então, que colar o braço na barriga por 30 dias. Aí, deu certo. A
pele da barriga foi parar na ponta do braço. Essa cirurgia existe a mais
de 50 anos e depois de tudo isto já tinha feito mais de 11 cirurgias.
Estava pronto para fazer colocação das próteses.
Hoje vivo muito bem sem os meus braços e
a cada dia agradeço a Deus por ter me dado minha vida de volta.
Independente de ser um deficiente físico, amputado, hoje percebo que
qualquer pessoa está sujeita a muitos preconceitos. Esses sempre vão
existir. Depois de ter passado por uma experiência como essa, dou valor
muito mais a vida.
Consegui colocar minhas próteses e me
adaptei muito bem. Estou casado após o acidente e sou pai de um menino. E
lutei muito para idealizar o site Amputados Vencedores,
criado em 2001. À partir de 2006 iniciei a carreira de palestrante,
fazendo palestras na área da segurança do trabalho e Sipat/Cipa. Tive o
privilégio de criar a cartilha “Vamos Praticar Segurança no Trabalho” e
ser o autor do livro Amputados Vencedores – Porque a Vida Continua,
lançado em 2010.
Por tudo isso, agradeço aos meus pais,
meus familiares e amigos pelo apoio e pela força que me deram. Também
agradeço as pessoas que me fizeram descobrir o que era o amor. A minha
esposa Jane e meu filho Vinícius. Obrigado e um abraço!
* Flávio Peralta é
palestrante na área da segurança do trabalho e Sipat/Cipa e autor do
blog Amputados Vencedores, que disputa o Prêmio Top Blog 2012.